Nestes tempos conturbados, muitas vezes a honra militar e o verdadeiro sentido dos que se dedicam à carreira das armas é atacada por inimigos externos ou mesmo aviltada pelos que envergam a farda.
Há na História da Igreja inúmeros exemplos de santos que foram militares e que usaram a sua posição para servir os interesses de Deus e da Civilização Cristã. São Sebastião foi um deles.
Infelizmente, a partir da Renascença, a iconografia cristã sofreu fortes influências humanistas, que dulcificaram a verdadeira figura dos santos e lhe retiraram tantas vezes a sua dimensão sobrenatural. São Sebastião foi certamente uma das principais vítimas dessa distorção.
Nascido no século III (ano 255) em Narbonne (França) e com festa litúrgica celebrada a 20 de Janeiro, São Sebastião foi comandante da Primeira Coorte das Legiões Romanas, no tempo dos imperadores Diocleciano e Maximiniano. Portanto, estava sob as suas ordens a tropa de elite do Império, bem conhecida pela sua valentia.
Não conhecemos nenhum documento capaz de nos esclarecer sobre a fisionomia do glorioso mártir, mas tudo leva a crer que seria grave e forte, principalmente porque São Sebastião era católico e nele agia a graça que eleva e fortifica a natureza humana, dando valor e intensidade incomparáveis às suas virtudes romanas.
Como admitir então que um valente comandante de coorte passasse a ser representado como um jovem melífluo como geralmente aparece na iconografia católica? Com efeito, São Sebastião é habitualmente representado como um jovem bem feito de rosto e de corpo, muito seguro de sua boa aparência, encantado de se exibir, com expressão sentimental e caprichosa, conforme se vê na imagem abaixo.
A atitude do seu corpo é de quem está preguiçosamente a gozar o sol e a brisa, encostado ao tronco de uma árvore, talvez por estar um pouco cansado de ficar em pé. Parece que nem as flechas cravadas no corpo lhe causam dor alguma.
Nada, na sua figura adulterada pela iconografia humanista e modernista, nos dá a impressão de que ele está a sofrer e à beira da morte. A lembrança de Deus e da vida eterna, a súplica para alcançar a perseverança final, a prece pela Santa Igreja, a invectiva salutar ou a palavra de bondade aos algozes, nada disto se mostra nas imagens que o representam.
Dir-se-ia que este jovem, enfastiado por se achar só, está à espera que o venham buscar para voltar aos afazeres da vida quotidiana. Em última análise, a distorção tentou transformar o santo, o mártir e o herói militar numa figura moralmente medíocre, preocupada exclusivamente consigo e com o mundo…
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A iconografia cristã, corrompida pelo humanismo e pelo modernismo, distorceu completamente a figura de São Sebastião, retirando-lhe a dimensão sobrenatural da santidade, o carácter da sua condição militar e o heroísmo que demonstrou no martírio.
A imagem que aqui apresentamos é obra pictórica de Sandro Boticelli, conhecido artista florentino da época do Renascimento, nascido provavelmente em 1445 e falecido em 1510.
Bem se pode afirmar, portanto, que a degradação e a distorção da iconografia cristã, faz parte de um processo que já tem mais de cinco séculos.
Mas esta não é, felizmente, a história do verdadeiro São Sebastião.
Cristão, enveredou pela carreira militar com o propósito de ajudar outros irmãos na fé condenados ao martírio pelas autoridades pagãs do Império Romano. Incorporado nas Legiões, ascendeu ao comando da famosa Guarda Pretoriana, a guarda privada do Imperador. Com as prerrogativas do seu posto ajudou alguns cristãos que fraquejavam na fé, até ser descoberto e denunciado ao Imperador.
Este chamou-o e como São Sebastião lhe confirmou que era cristão, convidou-o a renegar a sua fé. Recusando prontamente, o heróico militar foi condenado à morte pelo suplício de ser amarrado a uma árvore e alvejado com flechas disparadas por antigos companheiros de armas.
São Sebastião, porém, sobreviveu e recuperou-se milagrosamente, decidindo proclamar novamente o Evangelho e increpando o Imperador pelas injustiças e perseguições movidas contra os seguidores de Jesus Cristo. O Imperador voltou a condená-lo à morte, desta vez por espancamento. O seu corpo foi resgatado de um esgoto.
São Sebastião é muito popular em Portugal e no Brasil, havendo muitas igrejas, locais, festas e romarias a ele dedicadas. Por exemplo, a formosa cidade do Rio de Janeiro, capital do Brasil desde 1763 até 1960, chamou-se inicialmente São Sebastião do Rio de Janeiro, quando foi fundada por Estácio de Sá em 1565.
Este santo militar teve em Portugal uma ilustre «réplica» na pessoa de El-Rei D. Sebastião, que recebeu este nome por ter nascido no dia da festa litúrgica do grande mártir (20 de Janeiro). Tal como o seu santo patrono, também D. Sebastião foi um nobilíssimo exemplo de virtude católica e de heroísmo militar, tendo certamente morrido como mártir na Batalha de Alcácer-Quibir, a 4 de Agosto de 1578.