«De acordo com a doutrina católica, a prática homossexual está entre os poucos pecados que “clamam ao Céu por vingança”. Outro dia, ao arrumar documentos antigos em minha casa, chegou-me às mãos o Catecismo que usei quando era criança. Ao folheá-lo, encontrei a lista dos pecados que “clamam ao Céu por vingança”. Lá estava a homossexualidade juntamente com o homicídio. Por outras palavras, a homossexualidade deveria provocar uma rejeição semelhante à que suscita o homicídio.» Plinio Corrêa de Oliveira, in www.adelantelafe.com
Na quarta-feira (21), a declaração polémica do Papa Francisco para o filme «Francesco» escandalizou os católicos fiéis ao Magistério tradicional da Igreja. O Romano Pontífice publicamente incentivou o reconhecimento de leis de união civil para homossexuais, outrora condenadas pela unanimidade dos seus predecessores.
«O que precisamos criar é uma lei de união civil (em espanhol: ‘‘ley de convivencia civil’’). Dessa forma eles são legalmente contemplados. Eu defendi isso», afirmou o Bispo de Roma.
Esta declaração não apresenta autoridade magisterial e, por não se tratar de Magistério, não goza de infalibilidade pontifícia. Francisco não falou enquanto Papa, não ensinou em nome da Igreja Católica. Assim, esta declaração consiste em mera opinião privada (e pessoal) de Jorge Mário Bergoglio (depondo apenas contra ele). Desta forma, os católicos não são obrigados a assentir, devendo resistir a este erro ensinado pelo Papa.
A posição oficial da Igreja condena com veemência as uniões homossexuais. O Documento de 2003 da Congregação para a Doutrina da Fé [1] foi aprovado ‘ex audientia Sanctissimi’, isto é, o Papa João Paulo II assumiu-o em seu magistério papal, atribuindo-lhe autoridade pontifícia (e, assim, obrigando o assentimento dos católicos). Este documento deixa claro o dever do católico em se opor a quaisquer tipos de arranjos jurídicos entre homossexuais:
«Em presença do reconhecimento legal das uniões homossexuais ou da equiparação legal das mesmas ao matrimónio, com acesso aos direitos próprios deste último, é um dever opor-se-lhe de modo claro e incisivo. (…) 10. Se todos os fiéis são obrigados a opor-se ao reconhecimento legal das uniões homossexuais, os políticos católicos são-no de modo especial, na linha da responsabilidade que lhes é própria.»
Dito isto, passemos às interpretações que surgiram com a inconveniente fala do Pontífice.
A corrente optimista:
Após a grande repercussão, alguns católicos (em grande parte seguidores da hermenêutica da «continuidade» do Concílio Vaticano II) negaram que o Papa houvesse declarado uma proposição moralmente heterodoxa. Argumentaram que o vídeo havia sido alterado e que a média teria deturpado a mensagem de Francisco.
Em suma, estas pessoas afirmam que a «ley de convivencia civil» não se referia necessariamente a uma lei de união estável (união civil) como havia sido transmitido na média mundial. Aduziram que se tratava de legislações para acolher, proteger e integrar os homossexuais no meio social e familiar, protegendo a sua integridade física, honra, etc. Esta tese, por mais que possa ter sido feita de boa vontade, não coaduna com a realidade.
A corrente realista
O vídeo foi cortado em duas partes e editado. A primeira parte, onde o Papa se refere à integração dos homossexuais nas suas famílias, foi tirada de contexto (e nela parece que, de facto, o Pontífice não queria reconhecer os arranjos gays como «família», mas lutar contra a rejeição familiar). Contudo, a segunda parte foi a mais escandalosa: o Papa publicamente reconheceu e incentivou a elaboração de leis de união civil para homossexuais ao utilizar o termo «ley de convivencia civil». Esta postura contrariou as definições morais infalíveis do Magistério Ordinário Universal da Igreja Católica Romana, desprezando o ensinamento de todos os seus sucessores.
O assessor teológico do Papa Francisco, Dom Víctor Manuel Fernández (Arcebispo de La Plata), admitiu publicamente que «convivência» e «união civi» são a mesma coisa para o Papa [2]. Aduziu que permanece inalterado o ensinamento da Igreja sobre o matrimónio («casamento») sendo entre um homem e uma mulher, porém que o contrato de união civil poderia ser celebrado para homossexuais.
Além disto, pesa contra a declaração do Papa o facto de que nos Códigos Civil Argentino e Espanhol, «ley de convivência» é sinónimo de «união civil» [3].
Ademais, em gáudio, a grande média mundial veiculou ferozmente a informação de que o Papa Francisco já haveria anteriormente defendido o reconhecimento de uniões civis homossexuais. A BBC afirmou que, quando o Cardeal Bergoglio era Arcebispo de Buenos Aires, ao se encontrar no meio do conflito pela legalização do «casamento» civil entre homossexuais na Argentina, o futuro Papa já propusera o reconhecimento das uniões civis homossexuais. Para piorar a situação, o biógrafo do Papa, Austen Ivereigh, aquiesceu com a afirmação: «Não fico surpreso», «Esta era sua posição como arcebispo de Buenos Aires» e que «Ele [o Papa] se opunha ao casamento homossexual, mas acreditava que a Igreja deveria defender uma lei de união civil para «casais» homossexuais, dando-lhes protecção legal» [4].
Dominique Wolton escreveu um livro chamado «Política e Sociedade» (Editora Encuentro) onde acumula diversas entrevistas concedidas pelo Romano Pontífice ao longo do ano de 2016. Neste livro, Wolton admite explicitamente que o Papa já teria defendido as uniões civis gays: «O Papa defende que a ‘união civil’ dos homossexuais é possível» (ver página 232 do livro) e que «O matrimónio é a união de um homem com uma mulher. Esse é o termo preciso. Chamemos as uniões do mesmo sexo de ‘união civil’». [5]
Para piorar ainda mais, a Santa Sé não se pronunciou sobre o pronunciamento do Vigário de Cristo. Nem mesmo uma nota de retractação (ou, no mínimo, de esclarecimento) sobre a fala foi emitida.
O ponto de vista jurídico
A declaração do Papa contraria os preceitos mais básicos da lei natural e as definições do Magistério da Igreja. A Igreja não condena somente o «casamento» civil entre homossexuais, mas todo e quaisquer arranjos jurídicos que incentivem ou reconheçam o homossexualismo e seus consectários. A sodomia e os actos homossexuais em geral são actos contra naturam (contra a natureza humana) e, nas palavras do Catecismo da Igreja Católica, ‘‘intrinsecamente desordenados’’ [sic].
A Igreja sempre impugnou até mesmo a existência do instituto jurídico da «união estável» (ou «união civil»). Para os católicos, este tipo de união entre duas pessoas não casadas, mesmo que entre um homem e uma mulher, consiste em uma relação concubinária pura e não apresenta qualquer direito de existência. Do contrário, a lei civil incentivaria diversos vícios abjectos (tais como o acto conjugal fora e antes do matrimónio). Para piorar, o Papa não só reconhece este nefasto instituto civil, como também afirma que os homossexuais podem contraí-lo.
As consequências jurídicas são tenebrosas: se for reconhecido o direito de homossexuais contraírem união estável, estará se reconhecendo a sua união enquanto «entidade familiar», importando num conjunto de direitos próprios do Direito de Família. Assim, a «família» homossexual teria direito, por exemplo, à adopção de crianças (privando-as de um desenvolvimento sadio e integral, dada a ausência perpétua ou da figura materna ou da figura paterna).
Isso tudo faz-nos lembrar do postulado moral — e jurídico — que fora esquecido nos porões do Concílio Vaticano II e segundo o qual o erro não tem direito de existência, só o bem e a verdade o têm. Desta forma, primeiro o Concílio, de forma não infalível [6], negou os direitos divinos ao proclamar o condenado direito à liberdade religiosa (e de consciência) e a defesa da «sã» laicidade de Estado, em contrafacção ao reinado social de Nosso Senhor (que, infalivelmente, pressupõe um Estado Católico). E, se não bastasse a hierarquia se revoltar contra os direitos divinos, agora o Papa Francisco se rebela contra o direito natural, ao defender uma espécie de protecção jurídica do erro moral (do homossexualismo).
O que um católico deve fazer?
Este pontificado escandaliza todos os católicos. Os erros do Papa cada vez parecem piorar. Já vimos a Pachamama entronizada na Basílica de São Pedro, a Amoris Laetitia dando margem para a distribuição de comunhão a divorciados que vivem com «cônjuges» ilegítimos, a defesa da laicidade de Estado (contrariando a Quas Primas, Quanta Cura e os documentos infalíveis), a defesa da Fraternidade Universal (comemorada pelo Twitter de duas Grandes Lojas Maçónicas) e agora vemos a negação explícita da lei natural com um sucessor de São Pedro defendendo uniões civis para homossexuais.
Fica a pergunta: o que deve um católico fazer? A resposta é: resistir e se santificar. Deve consolidar-se na vida de oração e sempre defender publicamente a doutrina teológica, moral e política que a Igreja Católica sempre ensinou ao longo dos séculos. A Revolução conseguiu afincar-se na hierarquia (e em documentos do magistério ordinário) com o Concílio Vaticano II e está chegando a consequências dramáticas, jamais imaginadas neste pontificado. O católico deve resistir ao modernismo e às neo doutrinas e, antes de tudo, rezar pelo Papa Francisco e pelo fim da crise na Igreja. Cristo, Rei da sociedade temporal, com a intercessão da Virgem Co-redentora, irá destruir o modernismo eclesiástico e o pecado abjecto do homossexualismo.
Lucas Klautau
Notas:
[1] CONSIDERAÇÕES SOBRE OS PROJECTOS DE RECONHECIMENTO LEGAL DAS UNIÕES ENTRE PESSOAS HOMOSSEXUAIS
[2] “Convivência” e “união civil” são a mesma coisa para o Papa, explica Arcebispo assessor de Francisco
[3] «Uniones convivenciales» (Site oficial do Governo Argentino)
[4] Papa defende união civil gay: o que Francisco já disse sobre homossexualidade
[5] Dominique Wolton: “O Papa defende que a ‘união civil’ dos homossexuais é possível”
[6] Entenda a questão dos graus de autoridade e assentimento do magistério eclesiástico