A 21 de Dezembro de 1989, exactamente há 33 anos, a Roménia teve um Natal peculiar. O ditador comunista Nicolae Ceausescu, que oprimia o país há um quarto de século, foi derrubado numa revolução repentina que nem os próprios serviços secretos conseguiram impedir.
A população, oprimida por 42 anos de ditadura comunista, de escassez em produtos básicos e degradação das condições de vida, indignou-se quando o ditador reprimiu brutalmente algumas manifestações de protesto.
Chegadas a Bucareste, também a elas aderiu o Exército romeno. Ceausescu e sua mulher foram capturados e detidos logo no dia seguinte e fuzilados a 25 de Dezembro, depois de uma rápida condenação à morte decretadas por um tribunal militar especial.
O regime totalitário romeno foi marcado pela obsessão de reverter as baixas taxas de natalidade, na perspectiva de que o aumento da população fomentaria a economia e fortaleceria o país. A taxa de natalidade romena cresceu efectivamente com rapidez, mas a inépcia administrativa do socialismo não foi capaz de evitar duros efeitos colaterais que se traduziram em aumento nas taxas de mortalidade materna e infantil e também no número de crianças abandonadas e entregues aos milhares em abrigos estatais onde padeciam fome, doenças e maus tratos. Eram vítimas de abusos físicos, não recebiam cuidados de higiene e ficavam entregues aos cuidados de gente incompetente. Algumas das que sobreviveram, contaram mais tarde que eram «tratadas como animais selvagens que precisavam ser enjaulados».
«Essas crianças não são cuidadas, são contidas», noticiou uma reportagem da BBC dos anos 1990, descrevendo um «orfanato» romeno para crianças com deficiência. «Elas ficam em quartos escuros e imundos, com excrementos por todo lado. São crianças que precisam dos melhores cuidados, mas recebem os piores possíveis.»
No início da década de 1980, Ceausescu já tinha exaurido todo o capital anteriormente acumulado pela Roménia. A população romena sofreu severas restrições quando o governo tentou quitar de uma só vez toda a dívida externa do país (de aproximadamente 13 mil milhões de dólares). As privações incluíam racionamento de electricidade e de água quente, mesmo com invernos rigorosos.
Talvez uma das privações mais penosas tenha sido o «programa científico de alimentação» que a partir de 1982 passou a estipular a quantidade máxima de produtos que uma pessoa podia comprar mensalmente.
O Estado controlava o que cada cidadão podia consumir e ainda recomendava dietas para «poupar», ou seja, para lidar com a fome. Com efeito, o racionamento foi ficando cada vez mais apertado com o passar dos anos, enquanto Ceaucescu vivia numa luxúria desalmada, no colossal palácio que mandou construir — o maior edifício civil do mundo! — e entretendo-se com a sua vastíssima colecção de filmes pornográficos. Deste monstro, era amigo e admirador aquele que viria a fazer dois mandatos como Presidente da República Portuguesa: Mário Soares!…
Ao mesmo tempo, porém, os romenos foram tomando consciência da sua miséria graças ao contrabando de filmes em vídeo-cassette VHS, que começaram a circular em mercado clandestino, mostrando o que era a vida quotidiana no Ocidente e a facilidade com que se conseguiam todos os bens de consumo. Esses filmes eram discretamente distribuídos e exibidos para grupos de 20 a 30 de cada vez, mas o número de pessoas que os viam não parou de crescer, o mesmo ocorrendo com o descontentamento. As revoltas populares começaram então a intensificar-se até que o regime comunista acabou por cair de podre nessa sublevação conhecida como «Revolução do Natal» na Roménia.
Luís de Magalhães Taveiro