Apelo a Covadonga

6 Junho 2023

Imagem de Nossa Senhora de Covadonga

Tudo parecia perdido. Muitos cediam à tentação de desistir. Os muçulmanos do Norte de África tinham atravessado o Estreito de Gibraltar em 711 e rapidamente ocuparam toda a Península Ibérica. As elites visigodas, divididas pela guerra fratricida e seduzidas pelas riquezas e pelo poder, submeteram-se facilmente e passaram a viver cobardemente sob o domínio dos novos senhores, procurando manter o seu estatuto. Mas houve quem não se rendesse e resistisse como pôde e se mantivesse fiel. Por muitos sítios de Portugal e de Espanha há santuários que têm origem na descoberta de imagens durante o longo período da Reconquista Cristã, que tinham sido escondidas pelos cristãos em fuga, durante a invasão muçulmana. A descoberta da imagem de Nossa Senhora do Pranto em Dornes é um dos nossos exemplos mais eloquentes. E para onde fugiram? Para as montanhas das Astúrias, no Norte da Península.

Foi aí que, provavelmente em 722, acossados pelos muçulmanos que já se tinham dirigido para Norte, cristãos liderados por Pelágio (a quem o Bispo Oppas tentou dissuadir de lutar e pressionou para que se aliasse aos muçulmanos), arremeteram corajosamente contra os inimigos da fé, e o milagre inesperado aconteceu: contra todas as esperanças e cálculos humanos os cristãos venceram os muçulmanos.

[Foto: Gruta de Covadonga, no Monte Auseva das Astúrias]


A célebre batalha aconteceu junto à gruta de Covadonga, a «Cova Domina», a Cova de Nossa Senhora, onde se venerava a imagem da Virgem Maria que Pelágio e os seus companheiros invocaram naquele momento crucial para a nossa história e para a história do mundo.

Desta primeira vitória dos cristãos nasceu o Reino das Astúrias, cujo desenvolvimento levou depois ao Reino de Leão. E, graças ao prosseguimento da Reconquista, daqui nasceram o Condado de Castela (que depois se viria a tornar no Reino de Castela e que, unido ao Reino de Aragão levaria à criação do Reino de Espanha), e o Condado Portucalense, que depois se havia de tornar no nosso amado Reino de Portugal. Covadonga é tão significativa para a identidade das Espanhas, de Portugal, e do mundo cristão que destes reinos nasceu que, no século XIX, quando os autores românticos procuraram as raízes ancestrais da nossa Pátria, Alexandre Herculano escreveu o célebre livro «Eurico o Presbítero» que é, nem mais nem menos, do que a narração do extraordinário acontecimento que foi a Batalha de Covadonga, o evento que permitiu o renascimento cristão da Península e que, consequentemente, permitiu que a fé cristã fosse levada aos quatro cantos da terra.

De facto, a missão da reconquista e da propagação da fé cristã levou os portugueses de entre Douro e Minho até aos confins do Algarve, e em 1415 até Ceuta, no Norte de África. Percebemos porquê quando lemos na “Exortação da Guerra”, de Gil Vicente: «África foi de cristãos/ mouros vo‑la tem roubada». E em poucos anos a Cruz rubra de Cristo e as Quinas de Portugal, «por mares nunca dantes navegados», chegaram aos lugares mais exóticos do mundo até então desconhecido para os europeus. E Camões ainda acrescenta, enfaticamente, no Canto VII de Os Lusíadas: «E se mais mundo houvera, lá chegara»…

Quem conhece os portugueses sabe muito bem que só uma forte e profunda motivação espiritual poderia ter levado tão longe e tão alto os tranquilos habitantes da «ocidental praia Lusitana». Já percebemos o que é que nos falta hoje… Voltar a Covadonga é responder ao apelo de Cristo: «Ide por todo o mundo!», sabendo que para isso é necessário primeiro inflamar o nosso coração na mesma heróica fé que encheu o peito de D. Pelágio e dos seus companheiros de armas. Nessa Cova bendita onde um dia renascemos católicos cantaremos a plenos pulmões o «Salvé Nobre Padroeira», recordando, com gratidão e amor, essa outra Cova da Iria, que a Virgem Maria transformou em Altar do Mundo. E a Jesus Cristo, nosso Rei, cujas gloriosas Chagas adornam o nosso brasão, prostrados diremos: «A ti pertence a terra portuguesa / Nossa Rainha é Tua Mãe bendita / Somos cristãos não há maior nobreza; / Teu Coração de amor por nós palpita».

Até Covadonga! Para que em Portugal se conserve sempre o Dogma da Fé!

Pe.Fernando António, FSSP

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