Marrocos, 4 de Agosto de 1578: Portugal perdeu nessa data a famosa batalha de Alcácer-Quibir. Ficou sem Rei e logo dois anos depois perdeu a independência. O País entrou em profundo declínio e as suas possessões ultramarinas ficaram sujeitas ao saque e às investidas de potências que antes nem ousavam desafiar-nos. Foi um acontecimento trágico, sem dúvida.
Lisboa, 25 de Abril de 1974: Na fatídica madrugada desse dia ocorreu um golpe de Estado que, para a maioria dos portugueses, parecia bem-vindo, oportuno, desejado e salvador. Mas tinha sido preparado no estrangeiro por uma conspiração comunista, conforme se tornou claro logo nas primeiras horas. Cravos vermelhos, bandeiras vermelhas, foice e martelo, punhos cerrados, eram os símbolos revolucionários que por toda a parte dominavam. Em poucas horas o destino da Nação tinha mudado. Mais de 8 séculos de História eram renegados naquela data e mais de cinco séculos de expansão evangelizadora e civilizadora eram desdenhados em atmosfera de cega e estúpida euforia.
Foi um acontecimento muito mais trágico do que o de 1578.
Alcácer-Quibir por muito pouco não foi vitória consumada. Era uma batalha praticamente ganha até ao momento em que se fez ouvir um sinistro brado: «Ter! Ter!» (párem, suspendam!). Pode ter sido a voz de algum traidor que, espiando as fases do combate e reconhecendo a vitória iminente dos portugueses, tentou com isso alterar o rumo dos acontecimentos. O certo é que lançou a hesitação e que esta rapidamente deu lugar à confusão e depois à trágica derrota.
Nesta derrota, porém, houve Heróis e Mártires dignos de honra e glória, coisa que jamais existiu no 25 de Abril!
Em Alcácer-Quibir os portugueses não se entregaram quando a situação passou a ser favorável aos muçulmanos. Seguindo o exemplo de D. Sebastião, todos combateram até ao limite das suas forças, sob o sol escaldante de Marrocos, naquele dia 4 de Agosto de 1578.
Conta-nos Antero de Figueiredo (*) que, «na frente e nas ilhargas, os melhores portugueses, almas de lei, não esmorecem um momento e lutam com frenesim desesperado. Fazem prodígios! Vai caindo morta muita gente, e da melhor: os fidalgos de raça, os soldados experimentados, aqueles bravos fronteiros de África!»
«[…] E o Rei? Viu tudo, quer salvar tudo! Num relâmpago, para evitar a confusão, corre à frente dos terços de infantaria e de cavalaria […]. O seu esforço é prodígio! D. Sebastião está em toda a parte. Maior que a ordem de um general, ele é o exemplo de um homem que se põe à frente de homens. A sua presença é disciplina, é ordem, é força, é mando. Cria confiança, incita coragem. Cruz e bandeira do seu exército de crentes e ardidos, é um clarão de fé, um estímulo celeste vivíssimo, refulgentíssimo!»
E como El-Rei, quantos outros deixaram naquele dia os seus nomes gravados na História, atirando-se para o combate em paroxismos de bravura, valentia e façanha!
Um deles foi D. Teodósio II de Bragança que viria a ser pai de El-Rei D. João IV. Apenas com doze anos de idade, de tal modo se distinguiu que o rei mouro, de quem ficou prisioneiro, lhe permitiu que regressasse livremente à Pátria, sem pedir qualquer resgate.
E no mesmo rasto de heroísmo, com insuperáveis actos de bravura e sacrifício, estiveram D. João de Mendonça, antigo governador da Índia, João Lobo, Barão de Alvito, João da Cunha, cavaleiro da Ordem Soberana e Militar de Malta, André Gonçalves, Alcaide-Mor de Coimbra, D. Simão de Meneses, D. Sebastião de Sá ou Álvares Correia que morreu segurando com uma mão a espada e com a outra as tripas que lhe caíam do ventre!
Alcácer-Quibir foi um desastre nacional, sim, mas foi talvez o campo de batalha onde mais heróis portugueses tombaram, onde mais mártires derramaram o seu sangue, onde a honra e o dever foram defendidos até ao derradeiro sacrifício.
O 25 de Abril foi a antítese de tudo isso: cegueira, ignorância, estupidez e euforia, bem manipuladas por traição, perfídia, demagogia e mentira.
O resultado está hoje aí: somos um povo que carrega a infelicidade de odiar ou de ignorar o seu passado, de ter entregue as suas Províncias Ultramarinas ao comunismo e à guerra civil, de acreditar no socialismo, nesta falsa democracia e nos seus políticos, de se sujeitar com indiferença à extorsão e ao abuso do fisco, de aceitar leis iníquas e de aderir a uma mentalidade que tudo acata, excepto os Valores da nossa Civilização Cristã.
Resta-nos a esperança na mensagem de Fátima e nas promessas feitas pela Santíssima Virgem Maria. Mas para merecê-las, quem duvida que vai ser preciso mais heroísmo, mais sangue e mais sacrifício do que aquele que foi deixado em Alcácer-Quibir?…
A. J. Alves da Silveira
(*) Antero de Figueiredo, «D. Sebastião, Rei de Portugal», Livraria Allaud e Bertrand, 3ª Ed., Paris-Lisboa, 1924