
Na imensa lista de acontecimentos inusitados que povoam a nossa História, existe um que se destaca. O Brasil é o único país latino-americano que um dia foi unido à Europa.
Isso ocorreu a partir de 1815, quando o Rei D. João VI criou o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, que subsistiu até 1822, ano da independência proclamada pelo Infante D. Pedro de Bragança, que então se tornou primeiro Imperador daquele imenso país.
Desde 1808 que D. João VI estava no Rio de Janeiro com a Corte para não se deixar apanhar por Napoleão e pelas suas tropas invasoras. 1815 foi o ano em que o Brasil se uniu à Europa e também aquele em que Napoleão sofreu a derradeira derrota em Waterloo.
Mas como era essa Europa à qual o Brasil tinha acabado de se unir? «Era um continente assolado por revoluções e destruído pela guerra», diz o escritor Laurentino Gomes, observando que «o mapa do continente havia sido retalhado de forma drástica durante as guerras napoleónicas, reis e rainhas tinham sido destronados e humilhados pelo imperador francês». D. João VI foi um dos poucos monarcas europeus que não deixou cair a corôa nas mãos do inimigo.
Em 1821, o monarca português foi obrigado a abandonar o seu amado Rio de Janeiro e a voltar a Lisboa. A sua ideia mais genial – a criação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves – que uniu o Brasil à Europa, estava agora seriamente ameaçada.
Havia três alternativas em cima da mesa: (1) Portugal podia voltar a ser metrópole, continuando o Brasil como colónia. (2) O Brasil tornar-se-ia independente. (3) Ou – como solução intermediária – o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves continuaria a existir mas sob a administração de Lisboa.
O resultado das primeiras conversações parecia apontar para a terceira alternativa. A situação talvez fosse a mais confortável para o Brasil, mas com todo o desenvolvimento que a presença do Rei e da Corte ali promoveu, já era previsível que estivesse em condições de caminhar sozinho.
Entretanto as negociações não correram bem. A inabilidade diplomática das cortes portuguesas pretendia que todas as partes do Reino Unido ajudassem a escrever a nova Constituição, inspirada nos ideais da Revolução de 1820 (Revolução Liberal do Porto), mas acabou por não respeitar o Brasil. Quando este enviou os seus representantes a Portugal, já as principais decisões tinham sido tomadas.
Perante esta precipitação tão unilateral e tão discordante dos «democráticos» princípios liberais, o Brasil preferiu naturalmente optar pela Independência.
Felizmente ela ocorreu sem revoluções nem tumultos, ao contrário do que aconteceu em tantas nações das Américas. Acima de tudo, com a escolha do infante D. Pedro de Bragança (filho primogénito do Rei D. João VI) para a alta missão de reinar como primeiro Imperador, manteve-se a ligação histórica e a sólida amizade com Portugal, ligação sem par na história das nações americanas.
Luís de Magalhães Taveiro